Inovação Made in Portugal

Inovar…o mandamento mais sagrado de qualquer organização empresarial que não queira cair na obsolescência. Por acaso (ou não), é algo em que nós Portugueses somos razoavelmente bons: temos genuíno interesse pelo que é desconhecido ou novo, temos entusiasmo por novos produtos (early-adopters, como se diz no jargão da gestão) e temos um ADN de adaptar, improvisar sob pressão e exercer criatividade de forma não estruturada (origem da célebre e merecida fama do “desenrascanço”).

Há muitos séculos atrás, fizemo-lo com a nossa expansão marítima – inovando na arquitectura nas embarcações (aperfeiçoamentos constantes nas naus e nas caravelas), nos instrumentos de orientação (caso do quadrante, que aperfeiçoámos ou da balestilha, que inventámos) e nas técnicas para navegar em mar alto. Fomos suficientemente expeditos para não tentar fazer tudo sozinhos e com o conhecimento “caseiro”. Antes pelo contrário, e apesar de esta faceta não ser muito evidenciada nos livros de história, fizemos aquilo a que hoje se chamaria benchmarking (estudar a aprender com os exemplos e práticas de referência existentes por esse mundo fora – exemplo, com a civilização árabe) e atracção de talento (recrutamento de muitos e bons experts nas várias áreas científicas, de diversas nacionalidades e religiões).

Muito tempo passou desde esses tempos de ambição, conquista e inovação. Mas hoje, no mundo contemporâneo, continuamos a dar cartas em várias áreas, sejam elas inovação de tecnologia, de produto ou de processo. Só nos últimos 40 anos, e apenas de memória, cito uma mão cheia de exemplos de inovações com impacto a nível mundial: a Via-Verde, desenvolvida pela Brisa, que permite maior fluidez na circulação rodoviária; a criação dos primeiros cartões pré-pagos e prontos a usar para telemóvel (os Mimo, da TMN) que permitiram massificar estes aparelhos a nível global; o sistema Multibanco da SIBS, com um portfolio fantástico de serviços desde levantamentos a pagamentos de serviços diversos; as soluções de software da Critical, empresa de Coimbra, cujas aplicações foram adquiridas pela NASA para testar sistemas e mitigar falhas e erros; ou, para terminar, a botija de gás peso-pluma da Galp.

Hoje, com os desafios da globalização, as empresas portuguesas necessitam de uma cultura de inovação estruturada, inserida no ADN das empresas. Seja ela evolução incremental (passo a passo) ou disruptiva (mais radical), não pode estar dependente de epifanias de um dado momento ou do espírito de persistência criativa de um Edison do século XXI.

Efectivamente, há muito que defendo que a inovação tem muito de “cultural”. Deve estar inserida nos valores, missão e visão da organização e presente, de modo congruente, nos “momentos da verdade” da gestão do seu capital humano. Perguntas simples, de auto-diagnóstico, passíveis de usar por qualquer gestor: a “inovação” é uma das competências procurada nos colaboradores que recrutamos?; é um das variáveis avaliadas no processo de gestão de desempenho?; é reconhecida e premiada quando implementada e quando cria valor?; é trabalhada e desenvolvida em acções de formação, formais ou informais?; o investimento anual em I&D é prática regular?; existe um processo estruturada de incentivo à criatividade e inovação que incentive as várias áreas (sejam elas comerciais, marketing ou operacionais) a trabalhar em equipa e a acrescentar valor aos processos ou outputs da empresa?. Se a resposta for não a todas ou à maioria das questões, temos ainda um longo caminho pela frente para que inovar seja um valor e um factor distintivo da nossa organização.

Intimamente relacionado com a questão da cultura, temos o estilo ou modelo de liderança – em concreto, até que ponto o Líder pode ser um catalisador e facilitador da criatividade e da inovação. Com efeito, líderes que se assumam como conectores, colocando as pessoas a trabalhar efectivamente em equipa, como facilitadores da transparência e da partilha do conhecimento e que estimulem o empowerment das suas pessoas, facilitarão de sobremaneira a emergência de mais e melhores processos de inovação. O ADN de muitos dos líderes empresariais portugueses (especialmente, da nova geração), com evidentes competências de visão estratégica, flexibilidade e capacidade de coaching, tolerância ao erro e forte orientação à mudança é um sinal positivo para consolidar uma nova era. Uma era de inovação made in Portugal!

 

Carlos Sezões

Partner da Stanton Chase Portugal

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